Conflitos no ambiente de trabalho não se tornam insustentáveis de um dia para o outro. Muitas vezes são alimentados por anos a fio, até que eclodam. Pessoas, equipes e organizações pagam um preço alto por deixar de atentar ou de cuidar dos conflitos tão logo os seus primeiros sinais sejam identificados.
Defendo que as áreas responsáveis por monitoramento de riscos incluam em suas rotinas o acompanhamento dos níveis de conflitos internos – ao menos das áreas core e órgãos sociais relevantes – criando KPIs (indicadores) específicos com esta finalidade.
Neste particular, o modelo de escalada do conflito criado por Rudi Ballreich e Friedrich Glasl é especialmente útil para a avaliação da intensidade e das possibilidades de gerenciamento de conflitos organizacionais.
Apesar da expressão consolidada “escalada do conflito”, Ballreich e Glasl apresentam seu modelo como uma escada descendente, significando uma descida que, na linguagem coloquial, poderíamos chamar de “ladeira abaixo”. A escada é dividida em três grandes seções, as quais, por sua vez, se dividem em 3 degraus, conforme a ilustração adaptada que abre este breve artigo. Eu denominei estes três grandes grupos de Formação (do Conflito), Consolidação (do Conflito), Abismo (das pessoas e da instituição).
# degraus 1 a 3: Formação. Nestas etapas, há uma tensão perceptível, o ambiente se torna mais pesado, a comunicação entre pessoas e/ou grupos mais agressiva, debates se tornam recorrentes e intermináveis, os pontos de vista ficam mais rígidos. Embora ainda haja alguma oscilação entre cooperação e concorrência, cresce o número de situações de impasse, ter razão e ganhar o debate ganha importância, aumenta a polarização, a escuta fica prejudicada, até o ponto em que as pessoas ou grupos passam a agir de maneira independente, segundo suas respectivas perspectivas; grupos são formados e passam a atuar fechados em si.
# degraus 4 a 6: Consolidação. Nestas etapas ocorre a consolidação de coalizões entre pessoas e grupos, que passam a alimentar uma visão sempre positiva de si e extremamente negativa do(s) outros(s) grupo(s). Inicialmente, as críticas uns aos outros tendem a se fixar em competências e habilidades técnicas e pessoais, as quais vão se confirmando na medida em que a capacidade de percepção de uns em relação aos outros já está prejudicada; começa a haver esforços, conscientes ou não, para angariar apoiadores. O contágio acontece e cada vez mais pessoas acabam envolvidas no conflito ou no ambiente negativo dele decorrente. As interações se tornam mais violentas, podendo chegar ao insulto; um lado começa a inferir intenções ocultas do outro lado, não há mais confiança na integridade moral do outro e suas qualidades deixam de ser percebidas. Passa a ser justificável atacar, boicotar, evitar, isolar. Cada lado se sente como bode expiatório do outro. Nasce a percepção de que, se o outro não existisse, os problemas acabariam. As negociações se realizam através de ameaças e contra-ameaças.
# degraus 7 a 9. Abismo. Entramos na fase do vale-tudo, ameaças viram ações concretas, traidores e culpados são procurados, danos ao outro (ainda que à própria instituição também) são comemorados.
Não é necessário que o gestor conheça em detalhes cada degrau do modelo, mas pode ser útil conhecer os três grandes grupos acima, a fim de identificar a necessidade de atuação – sua ou de terceiros – para evitar a descida ao abismo.
A intervenção precoce é o principal fator para a reversão da situação conflituosa. Conflitos que chegam à fase que chamei de “Abismo” dificilmente podem ser revertidos, mesmo que pelos mais experientes mediadores. Por isso, estabelecer mecanismos de acompanhamento e atuação tempestiva, se possível ainda nas fases iniciais da “Formação” do conflito, pode evitar danos relevantes para as pessoas e para a instituição.