Chego ao terceiro e último pequeno artigo desta série (os dois primeiros publicados aqui no LinkedIn em 13 e 21 de junho passado, respectivamente).

Falamos anteriormente de equilíbrio na comunicação e conteúdo para uma conversa que gera confiança. Resta ainda tratar de como ouvimos. Em comunicação para cuidar de conflitos, a regra da reciprocidade é absoluta. Pessoas querem se expressar querem ser ouvidas.

Particularmente, acho desafiador ouvir. Se ouvir fosse fácil, não seria tema de tantos estudos, artigos e livros.  Hoje fala-se de escuta ativa, escuta compassiva, escuta com enlace, escuta empática, escuta regenerativa etc.

Encontro líderes (não poucos) que, ao relatar uma determinada situação de conflito, enfatizam o quanto foram atentos na escuta, mas “mesmo assim, nada adiantou”. E isso tem uma razão: as pessoas acham que sabem ouvir, mas estão longe disso. Pouquíssimas pessoas são realmente boas ouvintes. Muita gente simplesmente espera o outro acabar de falar – o que já é um começo – dado que a ansiedade tende a nos fazer interromper o outro frequentemente. Conversando com uma amiga que mora há muitos anos na Inglaterra, ela me relatou que, quando vem ao Brasil, chama-lhe atenção como os brasileiros interrompem mais do que os ingleses, fenômeno que ela não percebia quando morava aqui. Será que andamos muito acelerados, mais ansiosos ou apenas tagarelas?

Quando digo que não sabemos escutar o outro, quero significar exatamente isto: não saber. Fazemos cara de que estamos escutando, nos esforçamos para não interromper, tentamos arduamente desligar aquela nossa voz interna que fica contraargumentando tudo o que o outro diz, mas, ainda assim, não ouvimos!

Para alguém saber que realmente ouviu, pelo menos duas checagens são importantes e, ainda uma terceira, se possível.

Primeiro, certificar-se com a própria pessoa se entendeu o que ela disse. Isso se faz da forma mais simples do mundo, que é repetindo e pedindo confirmação. Se você já leu algum texto sobre comunicação eficaz (antes mesmo da disseminação da comunicação não violenta), já conhece essa ideia, que, de tão simples, chega a parecer boba e, no entanto, pode evitar muitos desentendimentos. 

Segundo, realmente considerar o que o outro diz. Ou seja, refletir sobre o que é dito. Parar, pensar, “respirar” um pouco sobre o assunto.

Ninguém é capaz de ouvir verdadeiramente se, em três segundos, já se coloca em modo contra argumentação. Se isso acontece, certamente a pessoa não ouviu refletidamente. E acontece especialmente quando já se tem uma “opinião formada” sobre o assunto. E pergunto: opinião formada significa opinião imutável? Não podemos “abrir mão” das nossas opiniões, ou mesmo ajustá-las em algum aspecto após reflexão? 

A terceira checagem requer um pouco mais de treino, e, especialmente no caso de conversas conflituosas, consiste em formular certos tipos de perguntas especialmente voltadas para “escavar” a origem última da tensão: sentimentos e necessidades subjacentes não atendidos (como articulado na segunda parte do artigo, publicada em 21 de junho).  

São checagens que não costumamos fazer, infelizmente. E por que não fazemos? A meu ver, muitas vezes porque a razão do nosso não ouvir pode ser -consciente ou inconscientemente – não termos interesse genuíno. Afoitos para nos expressar ou para que nossa opinião prevaleça, não vale à pena perder tempo em aprofundar a ideia ou a opinião divergente que o outro nos coloca.

Ocorre que, felizmente ou infelizmente, não há como fugir: a conversa que gera confiança, reduz conflitos e cria soluções é aquela em que há uma negociação legítima e saudável destinada a atender às necessidades de todos(as) os(as) participantes. A boa vontade recíproca nasce da percepção de que sou considerado(a) E igualmente considero(a) o que as outras pessoas pensam, sentem e necessitam.

Claro que, em certas situações mais complexas ou quando há um longo histórico de desgaste, pode ser necessária a facilitação do diálogo por um terceiro.  Faz parte e deveria se tornar uma prática mais comum nas organizações. Porém, a “virada” mais bonita de transformação se dá quando as pessoas se apropriam destas habilidades e passam a exercitá-las independentemente na vida.