Elaine Palmer

A ilustração que abre este artigo representa a sobreposição de cinco ilustrações encontradas no livro de Thomas d’Ansembourg “Deixe de ser bonzinho e seja verdadeiro”. Trata-se de um plano cartesiano cujos eixos são emissão e recepção da mensagem objeto da comunicação, uma espécie de medida da qualidade desta comunicação. 

A figura chamou minha atenção porque um dos temas mais suscitados em mentorias de liderança ou coaching de conflitos, e mesmo em facilitação de diálogos e mediações de conflitos, é justamente a qualidade da interação e da comunicação entre pessoas que trabalham juntas.

A expressão comunicação de qualidade pode ser excessivamente genérica para o contexto desde artigo: por comunicação de qualidade me refiro a diálogos que podem produzir entendimento e confiança dentro das equipes, o que, por consequência, tende a reduzir a incidência de conflitos destrutivos. 

Comunicar é se exprimir e ouvir. E ambos em equilíbrio. O desequilíbrio entre estes dois eixos leva aos extremos que d’Ansembourg classifica como o do tirano, de um lado, e da vítima, de outro lado. 

Sobressai o tirano ou a tirana que existe em nós sempre que tentamos impor nossas necessidades, desejos e opiniões, desconsiderando os dos outros. É quando assumimos nosso lado autoritário e controlador. Não queremos ou simplesmente não sabemos ao certo como escutar o outro. Nos exprimindo sem dificuldade, porém, estamos desligados da função “recepção”. 

O oposto também ocorre com frequência. É quando se adota a postura da vítima. Por cansaço, comodismo ou dificuldade de se posicionarem de forma efetiva, pessoas desligam o botão “emissão” e se submetem e/ou se resignam.

Nenhuma das duas hipóteses possibilita a construção de parcerias de trabalho duradouras e saudáveis. São formas de comunicação que, no médio prazo, deterioram as relações, em prejuízo do bem-estar de todos e dos resultados da equipe. 

Claro que nem todas as conversas nas organizações se situam nos extremos tirano-vítima, mas nem por isso são muito melhores. Conforme d’Ansembourg, muitas interações acontecem na área do plano que ele denomina “zona de desconfiança. São conversas em que tanto emissão quanto recepção não ocorrem no seu potencial máximo. As pessoas se exprimem pouco para não suscitarem críticas ou se tornarem vulneráveis e, na mesma moeda, ouvem superficialmente. A maioria das conversas se inserem nesta categoria, como evidenciado na ilustração acima. 

D’Ansembourg atribui o fenômeno ao nosso medo: tanto o medo de nos expormos de maneira mais verdadeira e eventualmente vulnerável, quanto de entrarmos em contato direto com as necessidades dos outros, e, com isso, nos sentirmos vinculados ou responsáveis por preenchê-las. O que ele chama de “zona de desconfiança” também poderia ser traduzido como “zona do medo”. Medo de falar e medo de ouvir. Particularmente, prefiro “zona do medo” porque “zona de desconfiança” remete à ideia de que a causa do problema está no outro – desconfio do outro.  

É importante pontuar que a uma boa comunicação no trabalho não pressupõe, a priori, irrestrita confiança no outro (embora, obviamente, confiança sempre ajude). Muitas vezes, a confiança é construída a partir da boa comunicação e não o contrário. Reforço: confiança é uma construção que se faz pela sucessão de boas conversas. Parcerias sólidas são consolidadas com o tempo a partir de diálogo de qualidade.  

O salto da “zona de desconfiança” para a desejada “zona de confiança” – que aparece no canto superior direito da ilustração acima – ocorre quando tanto emissão quanto recepção da mensagem estão em equilíbrio e bem desenvolvidas, e as pessoas podem manifestar livre e plenamente suas necessidades, vulnerabilidades, sentimentos, sem medo de crítica ou de incompreensão, ao mesmo tempo que se sentem suficientemente seguras e dispostas a ouvir o que o outro tem a dizer. Para d’Ansembourg, esta prática “nos permite arriscar maximizar a expressão de nós mesmos”. 

Em se tratando de relacionamento de equipes, o salto qualitativo é imenso. As conversas baseadas em troca de informações sobre necessidades recíprocas reduzem o potencial de conflito, e criam possibilidades de resolução mais sustentáveis quando eles ocorrem. Quando as pessoas passam a atuar e a realizar conversas com esta qualidade, o sentido de segurança psicológica se amplia. O desenvolvimento de tais habilidades se traduz em fortalecimento de autoestima e autoconfiança individuais e coletivas, vez que autoestima e autoexpressão se retroalimentam.

Infelizmente, a maioria de nós não foi ensinada ou não aprendeu a expressar o que realmente é relevante para si, nem a ouvir verdadeiramente o que é relevante para o outro. Muitas vezes sequer conseguimos nos conectar com nossas próprias necessidades, e, menos ainda, ouvir a dos outros. Por isso, permanecemos no “conforto” das relações mecânicas (anos a fio estagnados na zona de desconfiança). Quando os conflitos surgem, evidentemente, nossas ferramentas para o diálogo produtivo são limitadas. 

Ocorre que pessoas trabalham, produzem e decidem se comunicando. Organizações são, na verdade, uma grande rede de conversas. Logo, organizações serão tão produtivas e bem-sucedidas quanto as conversas que ocorrem todos os dias entre seus colaboradores. Conversas ruins ocasionam baixa produtividade, ambiente ruim, maus resultados. Também por isso, uma das grandes responsabilidades das lideranças e dos profissionais individualmente é buscar o aprimoramento da comunicação do time e em time, em benefício do bom relacionamento e da redução de conflitos no ambiente de trabalho.

 Há sempre um caminho a ser percorrido disponível para quem quiser aprender.